17 janeiro, 2008

Às voltas com Foucault

Quando escrevi o último texto lia o "Nietzsche" do Deleuze e tinha por perto os livros do Nietzsche para consulta. A desmistificação foi o exorcismo de Nietzsche: fechei os livros todos e guardei-os a um canto.

Com Foucault a história é diferente. Depois da "História da Loucura" vieram "As Palavras e as Coisas". Se no primeiro a prosa sempre difícil de Foucault (quase tão difícil como os aforismos de Nietzsche) foi vencida, no segundo veio muita frustração mas ficou, vejo agora, a semente.
Num alfarrabista (que devia ter fotografado) de Vina del Mar, no Chile, comprei três livrinhos de Foucault de nem 100 páginas cada: três das (famosas) conferências (ou aulas) que ele deu no Collége de France.
Apesar de serem em castelhano, estes livros para mim foram, já em Portugal, a chave para Foucault.

Na "História da Loucura" e depois na "Ordem do Discurso", Foucault diz que a loucura e a perversão não existem senão por serem uma oposição da "sanidade mental estabelecida" ou da "boa moralidade". Por outro lado diz que esses (e outros) espaços de marginalidade no limite do normal, só existem como negação do esquema de normalidade.
Se por um lado Foucault fala de mecanismos de controlo do discurso (ver texto "Macacos de Imitação") sobre os quais estes esquemas de normalidade sobrevivem, por outro, fala-nos das instituições que vigiam e fazem vigorar as suas fronteiras, nomeadamente as instituições de segurança pública e as instituições psiquiátricas, pondo os polícias e os psiquiatras no mesmo grupo. Estas fronteiras, constituídas pelos fenómenos de marginalidade, são _criadas_ pelo próprio esquema de normalidade. Por outras palavras, um louco ou um assassino só o é porque alguém o julga assim.

Eu _acredito_ mesmo nisto! Julgo a normalidade uma perversão e encaro fenómenos como a depressão, o alcoolismo, a delinquência, a droga, a prostituição, a ?guerra?, a psicose, a homossexualidade (o Foucault era gay), etc, etc, etc, como consequências naturais (ou partes integrantes) do esquema social em que vivemos e NUNCA como perversões a um sistema saudável. O moralista é SEMPRE tão perverso como o moralizado. A perversão faz parte do sistema, a perversão é o sistema, o sistema é perverso.

Nietzsche já nos tinha dito que o polícia é tão imoral como o pior dos assassinos.
Foucault acrescenta que o psicólogo/psiquiatra é tão louco como o pior dos esquizofrénicos (Foucault é formado em psicologia).

(a ver: o filme "Tropa de Elite" (Brasil) sobre polícias loucos e o indescritível "Os Mestres Loucos" de Jean Rouch com loucos tão saudáveis)