09 dezembro, 2007

Macacos de Imitação

Hoje falo-vos de como o Dawkins se inspirou no Foucault e este nos estruturalistas. De criatividade e de globalização. De macacos de imitação.

Dawkins
Há já uns anos que entrei neste beco filosófico sem saída. Em Franca no meu cubículo de 18m2 de Antibes. Dawkins e o seu gene egoísta foram o pórtico. Os genes copiam-se e os "memes" também. Dawkins apresenta no seu livro "O Gene Egoísta" a sua ideia de que os genes são entidades que nos usam a nos, seres humanos, para sobreviver. Ha uma troca de entidades. O ser humano deixa de ser a entidade central e passa a ser uma entidade auxiliar de uma teoria que é centrada nos genes. Nós somos maquinas de copia e transmissão de genes, que nos usam, como maquinas, para sobreviver.
Dawkins aplica esta teoria a outro contexto: as ideias. Define os memes como unidades de cultura, em vez de unidades genéticas (como os genes). Os memes são ideias que são transmitidas, tal como os genes. Sendo que as ideias são, novamente, as entidades centrais da teoria. Nos somos maquinas de copia e transmissão de ideias.

Foucault
Foucault, inspirado pelos estruturalistas, já tinha dito o mesmo que Dawkins.
Na filosofia a questão começou com os linguistas. Os estruturalistas falam de um sistema que fala por nos. Nos somos maquinas de repetição que fazem o sistema seguir, tal como os mecanismos genéticos. Os estruturalistas esquecem o individuo e falam de uma cultura que vive por si. Entidade mais importante que o individuo.
Neste caso, são as ideias que são transmitidas: unidades de discurso e cultura. Aprendemos os discursos do sistema através da educação (numa perspectiva abrangente do termo) e limitamo-nos a misturar e repetir tudo o que aprendemos/absorvemos.
Foucault, mais linguista que os próprios estruturalistas, esquece o sistema e fala apenas de indivíduos e discursos. Discursos aprendidos e repetidos por indivíduos que transmitem elementos de cultura.

Dawkins vs Foucault
O que Dawkins faz no seu gene egoísta é copiar a ideia de Foucault e apresentá-la de uma forma mais simples e, quanto a mim, menos interessante.
Dawkins ignora a palavra discurso, que Foucault tanto gosta, e fala de ideias. Já aqui esquecendo toda a complexidade da linguística, que, quanto a Foucault, é onde jaz toda a mecânica da transmissão.
Dawkins fala de memes como unidades discretas de cultura. Foucault fala de discursos, linguista e de emaranhados inqualificaveis de unidades (sequências, series, contínuos) de cultura.

Os mecanismos da imitação
Dawkins diz que os memes que são passados tem de ser como os genes, aptos. Os mais aptos passam. Foucault fala dos mecanismos de controlo do discurso e divide-os em vários tipos. Foucault fala, por exemplo, de tabus, rituais associados ao discurso, conceito de loucura, etc.

Criatividade
Neste contexto podemos usar a analogia de Dawkins (genes/memes) para falar de criatividade. Um ser humano é tão capaz de criatividade (em termos de memes/ideias) como a natureza (em termos de genes/fenotipos).
Aqui vamos progredindo nas possibilidades infinitas do discurso (viajando na biblioteca de babel). A criatividade não existe. A criação é a chegada a novos espaços possíveis de discurso, a pontos não utilizados (desconhecidos) da biblioteca de babel. Sempre sob a permissao dos mecanismos de controlo do discurso de que Foucault fala.

Volatilidade de Significado
Por outro lado, é necessário ter em conta que um mesmo texto, pode ter significados diferentes em contextos diferentes. Voltamos a Borges e ao seu Quixote de Menard. Este ponto é interessante mas não fundamental para a questão.

Macacos de Imitação!
A síntese: tudo é copiado e nós somos máquinas de cópia. Desde que aprendemos a falar até quando aprendemos uma profissão. Passando pelos sonhos e projectos de vida, por aquilo que fazemos no dia a dia, pelas frases que dizemos. As frases que dizemos. "As frases que dizemos". "As frases que dizemos" é uma frase repetida, que EU repito. Tudo o que digo, aqui e não só, é só uma repetição misturada de coisas que de alguma forma absorvi.

Ou Contadores de Anedotas
Por outras palavras (numa perspectiva mais Dawkinzesca), o conhecimento é como uma anedota, e nós os respectivos contadores. Se for boa é memorizada e repetida, senão, é esquecida. Nesta analogia, nós vivemos em emaranhados de anedotas. Os processos de selecção destas anedotas são complexos linguisticos e psicológicos.

Globalização
Um aspecto prático deste assunto é a globalização. A partir do momento em que existem meios de comunicação capazes de fazer passar discursos/culturas a nível mundial, os mecanismos de cópia, transmissão e selecção começam! Os discursos/culturas mais aptos sobrevivem, os outros extinguem-se! A competicao da seleccao natural dos memes agora é a nível mundial...
Seria agora o lugar para uma análise da cultura global que nos invade e a sua componente norte-americana... ou para vos falar da cultura da Bolivia como um animal que de repente tem de competir pela sobrevivencia com outro animal muito mais apto (dadas as condicoes globais) e acaba a beber coca-cola em vez de mascar coca, isto eh, extingue-se...

Ética
Como reagir a isto... no próximo episódio falo de defesa das nossas ideias, isto é, da utilização da crítica na defesa da máquina de transmissão de ideias que somos.

1 comentário:

AmaliaPorAmor disse...

Interessante! :)

Será que mudar mentalidades e a evolução das sociedades (como por exemplo, a abolição da escravatura, o desaparecimento do racismo, a igualdade entre hetero e homo) são tão difíceis de "engolir" por estarmos tão formatados?